"Eu me preparei para enfrentar a adversidade. Estou acabando de escrever o Manual dos Frustrados, Fodidos e Oprimidos. Nele descrevo, minuciosa e sistematicamente, os métodos mais sujos e destruidores para se ir à forra de qualquer inimigo, seja ele quem for, forças armadas, companhias de serviços públicos, companhias de cartões de crédito, bancos, a polícia, o proprietário senhorio, a loja comercial, qualquer pessoa ou instituição que tem força e sacaneia os outros (...)"
. . .
segunda-feira, outubro 30, 2006
Tenho uma grande constipação,
E toda a gente sabe como as grandes constipações
Alteram todo o sistema do universo,
Zangam-nos contra a vida,
E fazem espirrar até à metafísica.
Tenho o dia perdido cheio de me assoar.
Dói-me a cabeça indistintamente.
Triste condição para um poeta menor!
Hoje sou verdadeiramente um poeta menor.
O que fui outrora foi um desejo; partiu-se.
Adeus para sempre, rainha das fadas!
As tuas asas eram de sol, e eu cá vou andando.
Não estarei bem se não me deitar na cama.
Nunca estive bem senão deitando-me no universo.
Excusez un peu... Que grande constipação física!
Preciso de verdade e da aspirina.
Álvaro de Campos, Poemas
sexta-feira, outubro 27, 2006
Fotografias de Misha Gordin
Ouço-te muito longe. Sigo. O teu olhar é só o teu olhar. O de sempre. O mesmo. Caminho soprando o dia para trás. A vida doce. Vida vida vida. Vida.
Verti na pia. Na casa dos homens de vida vazia. Além do azul infinitas cortinas de amargas pulsões, bafos e faróis, estufas. Vida.
Toquei na ferida, nos nervos dos fios translúcidos. Fui feliz no palco de infinitas cortinas. Veias. Vazias. Faróis. Sinais. Estufa. Vela. Longe. Mais. Vida.
Adormeceu e desligou a alimentação central. O dia iria nascer em breve.
quinta-feira, outubro 26, 2006
Incinerar
segunda-feira, outubro 23, 2006
Por trás das nuvens está apenas o sol!
Estava em casa perdida e andava de um lado para o outro como se tivesse pouco tempo para qualquer coisa e esquecia o que seria e sentia uma despersonalização muito forte, intensa de mais para ser apenas uma ilusão.
Começara o dia com dificuldade, ouvindo um barulho não identificado e querendo ficar mais um pouco naquele quase casulo absoluto, tão diferenciado da realidade fria.
Tinha de se levantar. Maquinalmente tirou as pernas de dentro da cama pôs os pés no chão. Impulso.
Passou os quartos o corredor o hall ignorou a casa de banho e espreitou a sala. Dirigiu-se à cozinha.
Precisava da nicotina. Tossiu.
Tratou ainda cheia de borboletas nos olhos do pequeno-almoço e entregou-lhe ritualmente. Ele aceitou-o e pediu que acendesse a luz.
Claro! Fazia sempre tudo sem abrir a boca. Esquecera-se de dizer bom dia, mas ninguém lhe garantia que fosse mesmo ser um bom dia!
Estava zangada por sentir sono. Estava cansada e culpava a vida. Inusitadamente. Repetia para si mesma que ao domingo teria de se deitar mais cedo. Pensava sempre isto no começo das manhãs de segunda-feira.
Bebeu dois cafés até o dia arrancar mesmo. Estava uma tarde fria e ouvia uma ária de ópera.
Lá fora o barulho dos autocarros a circular pela rua, os carros, atrupido quase apenas rodoviário.
Novembro 2003
[Tudo é datado. E ainda bem!]
Perlompompero
1974
1/1/74
Agora a luta é comigo. Se quero aguentar mais uns tempos é dominar os meus demónios interiores, a moleza d'alma, o deixar-andar, o impedir pelos meios ao meu alcance a repetição dos erros do ano passado, que alguns deram frutos mas nem sei se compensadores.
(...) Enfim, conhecer os meus limites e tentar superá-los apenas se a ousadia valer os riscos e em plena consciência. (...)
Amanhã, mudar de programa. Vai ser um combate incerto que derrotas, desânimos, mesmo períodos de crise, poderão comprometer definitivamente. A ver vamos.
Luiz Pacheco, Diário Remendado 1971-1975
sábado, outubro 21, 2006
Tenho saudades tuas. Será que sabes? Fico morna e ardo em silêncio e no fim da noite não aguento mais. Tenho saudades tuas. Será que sentes? Faço-me forte e sou mas vacilo quando não sinto o teu cheiro. Tenho saudades tuas. Não vejo a hora de olhar os teus olhos e sentir que estás aqui. Já me conheces tão bem, sabes de cor os meus limites, as minhas loucuras. Não é bom o reencontro? Mato as saudades com um abraço que repudias.
Tua,
Mulher Elástico.
quinta-feira, outubro 19, 2006
Variações
terça-feira, outubro 17, 2006
... já cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio.
Raduan Nassar, O ventre seco
Parabéns lindinha!
Amigo
"Procura-se um amigo. Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir.
Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor...
Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo.
Deve guardar segredo sem se sacrificar. Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objectivo deve ser o de amigo.
Deve sentir pena das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer. Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância.
Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim. Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive."
Vinicius de Moraes
Parabéns, Alexandra, por seres quem és, como és... Há quem procure. Quem nunca encontre. Há quem já encontrou. Tudo vale a pena quando a partilha existe. Beijos dos Pêra. "Velhota"!
domingo, outubro 15, 2006
Tenho andado com uma puta-de-uma-neura que provoca uma azia-absorvente-do-espaço-envolvente e um cabrão de um desencanto.
SPM misturado com o arrastar de dias cansativos, descanso sem qualidade e uma dieta pobre em calorias.
Assim, como os Pêra, eles mesmos, coitadinhos!, já nem me podem ouvir, aceitamos o convite do cunhado e da minha Su Mana Mané e fomos até à Assenta passar o fim-de-semana.
O mar definiu qualquer coisa dentro de mim. Escrevi na areia mas veio uma onda e foi-se a prosa. Cá dentro ficou um espaço novo redefinido e fortalecido...
A inquietação segue em:
Fotografias de Choninha
terça-feira, outubro 10, 2006
*
Não tenho respostas
Não tenho respostas.
Quero atordoar-me no barulho,
para que o silêncio das palavras,
não me mate de dor o coração.
Irrelevante!
Há estados intemporais.
Isabel Magalhães
A Isabel está em http://a-redea-solta.blogspot.com/ , as suas telas em http://immm.blogspot.com/ e tem umas fotografias no Flickr que denunciam um olhar especial.
segunda-feira, outubro 09, 2006
Há uma nuvem no meu olho direito
Há qualquer coisa nos meus ouvidos
Um som de mar que ficou
A areia da praia é sempre diferente
Ondas vêm e vão
Movimento perpétuo
Fé renovada
O vazio
No fundo da tua alma o meu cheiro
Desencontrado
Os teus olhos cansados
Famintos
A cor pardacenta gasta dos meus pensamentos
Sou assim como sou
Sinto no ventre o sonho perdido
Sinto no dia a força esquecida
À noite quero dormir e esquecer
Quero sonhar e lembrar