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sexta-feira, outubro 21, 2005

Fragmentação de um desvio

(Tive de sacar isto do computador do Martim Pêra, que vai haver inovação tecnológica cá em casa e o dito cujo vai para a reciclagem. É de 2003, um ano complicado, com a doença de T., que infelizmente teve o desfecho preconizado pelos médicos. Nunca o esqueceremos! Digo isto para enquadrar o tom depressivo e lamuriento.)





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O dia hoje está com cara de ontem, com um sabor conhecido, com um cheiro familiar.Zangado com a primavera chorou de mágoa, ao acordar.

A introspecção deu lugar à bonança e as nuvens comezinhas foram-se afastando, caladas, algumas chegaram mesmo a desaparecer...

O dia hoje é só mais um, não é o.


Tinham voltado a dormir juntos. Tinham voltado a chamar-se com carinho.

Talvez pudesse ser diferente, talvez conseguissem descobrir de novo o olhar de cada um como um reencontro desejado e adiado. Alguma coisa largada algures, não lembravam onde, fora perdida, onde fora deixada. Sentiam esperança que tivesse de facto existido.


Acordou e deixou-se ficar.Tapada, em silêncio, docemente embalada pela falta de vontade. Gostava de poder ficar assim, deste gostinho depressivo mas não deprimente, deste encantamento face a nada.

Sabia que dependia dela que tinha o poder de ficar ou sair. Que podia ficar só assim, que podia sair, que podia voltar, que poderia não voltar e sair ou ficar; que as coisas não tem apenas um lado, nada é finito, nem mesmo a morte. A vida e a morte são apenas dois universos distintos?



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Cansada do sempre igual, do dar sem receber, da estagnação, de viver sem paixão, com este sabor a nada na boca e no peito. Cansada das pessoas. Não as quero sentir, ouvir ou ver. Cansada da vida mas não cansada de viver.

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Era sempre assim ao acordar; aquele peso, aquela desorientação, aquele sonho esquecido. Tempo de olhar sem ver, de viver sem dar.
Era o mesmo de sempre vestido de cores diferentes. Ninguém. Tempo. Sonho.
A constança de sentir apenas a inconstância contida, a impermanência, a solidão. O sabor a nada...

O vazio é absolutamente igual (ao outro). Nada o enche, nada o preenche. Nem o sol nem a chuva, só o amor se existisse...


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Sinto um cansaço grande, só mesmo cansaço do cansaço que sinto, sem entrelinhas à mistura; sem saturação ou tristeza. Dormir pouco e sonhar muito e acordar sem vontade de sofrer numa cadeira de dentista. Não fui, deixei em branco a marcação!


“... Primeiro estranha-se, depois entranha-se.” Fernando Pessoa

Era apenas uma peça manhosa do jogo.
Era só outra, a mesma, aquela que sempre fora.
Agora sabia, o tempo avançava impiedoso e as marcas que deixava eram dolorosas mas aprendeu a gostar de se conhecer, de saber quem era.

3 comentários:

maresia disse...

não sei o que dizer

graziela disse...

Tive que apagar o comentário acima, porque o blogger não está bom e aparecia o comentário do outro blog de fotografias que eu tenho.
Dizia que gosto de lêr as tuas "coisas" e sentir os teus estados de alma, que bem compreendo.
um abraço
graziela

Concha Pelayo/ AICA (de la Asociación Internacional de Críticos de Arte) disse...

Chonina. Te envío un beso fuerte.