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sábado, julho 29, 2006

Adoro-te, Nariz de Ferro!


“Sou eu, o Nariz de Ferro”, disse o homem aboletando-se na poltrona como se fosse fazer uma longa viagem. “Percebo que o senhor está querendo me catalogar, mas não adianta, nem eu mesmo sei se sou branco ou preto, mouro ou judeu, o que aliás não tem a menor importância de uma forma ou de outra. Sou um homem que sabe das coisas, passo os dias no telefone para me informar. Os jornais não dizem nada e a televisão, bah, a televisão é o ópio do povo, como disse Lenine. Telefono para banqueiros, parlamentares, generais, jornalistas, ministros, tiras como Raul, ladies que fuçam no interespaço ocluso, como disse Balzac - ligo para um lado e outro da cortina e no fim do dia já sei para onde o vento vai soprar; aí abro minha vela, estás me entendendo, e vou vendendo minhas especiarias para os ofuscados, e o produto converto em diamantes e selos, uma fortuna que posso transportar na boceta de uma virgem, se precisar fugir de alguma conjuntura; mas esse momento ainda não chegou, a época é de plantar a grana e colhê-la dourada e sumarenta nas vísceras dos ambiciosos, como disse o Mahatma Gandhi. Não cheiro mais, nem vendo o que você está pensando, tem muita gente levando e o vício legal dá mais, que o diga a Souza Cruz. Conheço todos os bacanas do mundo e sei que a bunda deles é mole. Quando era menino via as mulheres passarem desdenhosas nos seus carros, as mãos corruscando de jóias, e almejava ardentemente tê-las segurando o meu pau. Também queria, na mesma época, conhecer o Carlitos, mas ele morreu antes. Morreu, fodeu-se. Nunca tive um ídolo. Pensei numa época em Jesus Cristo, mas ele foi um fracassado, como disse o Cardeal Arcebispo. Estás me entendendo, trafiquei amendoim, graxa de sapatos, chicletes, cano de chumbo, erva, pó, limão roubado da feira, não nessa ordem. Fui dentista da meia-noite. Morei nos bueiros, com os ratos. Já cuspiram, mijaram e cagaram em mim. Ou eu morria ou virava essa maravilha que sou.”

(...)

“Eu me preparei para enfrentar a adversidade. Estou acabando de escrever o Manual dos Frustrados, Fodidos e Oprimidos. Nele descrevo, minuciosa e sistematicamente, os métodos mais sujos e destruidores para se ir à forra de qualquer inimigo, seja ele quem for, forças armadas, companhias de serviços públicos, companhias de cartões de crédito, bancos, a polícia, o proprietário senhorio, a loja comercial, qualquer pessoa ou instituição que tem força e sacaneia os outros. Ensino a técnica adequada para devassar, desmoralizar, arruinar, aniquilar, exterminar indivíduos e organizações odiosas, mostro como atacar saindo das sombras, como atormentar e destruir sem misericórdia. Pela sua cara vejo que não gosta de mim.” (Esse livro, na verdade, nunca foi escrito. Nariz de Ferro gostava de jactar-se não apenas das coisas que havia feito, mas também das que ainda ia fazer.)


"A Grande Arte"
Rubem Fonseca

1 comentário:

BÓLICE disse...

Se assim pensas, ó XONINHAS eu estou contigo para o que der e vier, porque...

O BÓLICE sofreu uma mutação... lol'É... nova personagem da Saga-Star-Wars...
o BÓLIC'ÉDI-KNIGHT... AAAAUUUUuuuuuuuuuuu...

I'ntÉ'FORCE-with-YOU